quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Resumo-tradução do Capítulo 8 (METADE): We’ll support you evermore? Football in the Media Age, 1961-1985.

Esquema de

RUSSELL,Dave

(1997) Football and the English – A social history of Association Football in England, 1863-1915. Preston: Carnegie Publishing. Capítulo 8: We’ll support you evermore? Football in the Media Age, 1961-1985. pp. 181-208.

[i] Prólogo (181):

- Escrevendo em 1984, o sociólogo Stephen Wagg argumentava que, “Pela maioria dos critérios o principal significado do futebol na sociedade britânica contemporânea é de um show de televisão”. Embora a relação entre o futebol e a televisão forme apenas uma parte relativamente pequena deste capítulo, a sagaz afirmativa de Wagg identifica o fato central que ditou as relações entre futebol e sociedade no período entre os anos 60 e 80. Tão simplesmente, mais pessoas experimentaram o futebol pela televisão, e pela mídia em geral, do que assistiram em estádios. Isto modelou as percepções, lealdades e atitudes de maneiras cruciais. Em um extremo, os clubes principais ganharam uma imagem crescentemente glamorosa e um número crescente de adeptos. Por outro lado, a imagem de um esporte atormentado pelo hooliganismo diminuiu o status e a importância do futebol. Em 1985 as imagens negativas superaram as positivas e o futebol entrou em crise.

[ii] Crowds, hooligans and fans (181-194):

(181) A composição social do público do futebol mudou muito pouco no período. A única exceção é que o jogo passou a atrair uma maior proporção de jovens (do sexo masculino) menores de 20 no final do período em questão, um ponto que será significativo no que diz respeito à questão do hooliganismo. Aparte isso, mesmo no fim dos anos 80, cerca de 80% dos torcedores ainda eram provenientes da classe trabalhadora e de ocupações próximas. Grupos étnicos minoritários continuavam a ser sub-representados, formando somente 1 ou 2% do público típico, cuja vasta maioria ainda era do sexo masculino. Já se falava na necessidade de atrair mais público feminino, mas isto geralmente ocorria quando as revistas estavam sem ter o que publicar.

(182) O mais impressionante é que o público continuou a cair neste período. O público total [das 4 divisões da Football League] caiu de 28.619.754 em 1960-1 para um recorde negativo de 16.488.577 em 1985-6. Neste quadro geral, houve interessantes contra-correntes. Houve, por exemplo, sete temporadas entre 1962-3 e 1976-7 em que o público total na verdade cresceu, com o crescimento mais marcado ocorrendo no fim dos anos 60. O sucesso da Inglaterra na Copa de 66 é geralmente visto como a causa deste aumento, que viu o público chegar a 30 milhões na temporada 1967-8 pela primeira vez em quase uma década. Só depois de 1977-8 é que o declínio tornou-se contínuo, com 9.7 milhões de torcedores abandonando o jogo em 1986.

(182) Também vale a pena notar que alguns clubes tiveram mais sucesso em manter o público do que outros. O público da primeira divisão se manteve bem mais do que o das outras divisões, declinando somente 30% entre 1961-2 e 1985-6, comparado com quedas de 50% na 2ª., 48% na 3ª. e 64% na 4ª. divisão. Estas diferenças foram causadas em parte pela escolha dos torcedores, em parte pelo poder das imagens geradas pela cobertura de TV e imprensa geralmente intensa dispensada aos clubes mais importantes. Os padrões de torcida para determinados clubes também são reveladores. Em geral, a maioria dos clubes viu a presença dos torcedores aumentar e cair mais ou menos de acordo com seu sucesso dentro de campo. O Arsenal, por exemplo, teve uma média de 43.776 na temporada em que fez o double [campeão da 1ª. divisão e FA Cup] em 1970-1, que despencou para apenas 26.945, à medida em que o time caía para a 17ª. posição em 1975-6, antes de se recuperar em 1978-9, quando alcançaram um respeitável 7º. lugar e venceram a FA Cup, com uma média de público de 36.771. Um pequeno número de clubes, todavia, manteve uma surpreendente lealdade na adversidade, sobretudo Newcastle e Sunderland, ambos regularmente entre os 10 clubes com mais público na FL a despeito de longos períodos na 2ª. divisão. Novamente, pode falar-se que a idéia da lealdade dos torcedores do nordeste da Inglaterra versus a volubilidade sulista tem algum apoio nos registros históricos.

(183) O mais impressionante desempenho em termos de público pertence ao Manchester United. O clube sempre teve bastante torcida, com sua posição na tabela de público sendo geralmente superior a sua posição na tabela de classificação. Nos anos 50 e no início dos anos 60, todavia, os públicos do Manchester United seguiam mais ou menos um padrão estável, com o tamanho do público refletindo mais ou menos o sucesso dentro de campo. A grande transformação ocorreu em 1966-7, quando seu triunfo na 1ª. divisão em um ano de crescimento em geral do público viu a média saltar de 38.769 na temporada anterior para 53.854. Na temporada seguinte, quando ficaram em 2º. na liga e ganharam a Copa Européia [hoje Champions League], os números subiram ainda mais para 57.552, a maior média de público jamais alcançada por um clube inglês. Daí pra frente, o United continuou a reunir um público massivo. Nas 22 temporadas entre 1964-5 e 1985-6 eles foram o time com mais torcida no país em 19 ocasiões, sofrendo uma queda de apenas 1% no público em um período em que a 1ª. divisão como um todo sofria uma queda de 29%. Significativamente, tudo isso acontecia a despeito de uma performance dentro de campo que era, particularmente nos anos 70, geralmente modesta. Mesmo um período desastroso entre 1972 e 1975 que viu o United em 18º. Lugar e depois rebaixado para a 2ª. divisão alterou muito pouco os níveis de público.

(183-4) Algo mais do que simples lealdade local estava operando aqui, pois o United claramente estava atraindo torcedores de todo o norte e, na verdade, de outras partes do país. A um grau até então desconhecido, os torcedores estavam pagando para se identificarem com um time, quase com um produto, tanto quanto aos resultados dentro de campo. Embora a tragédia de Munique tenha dado ao clube uma aura que o diferenciava de todos os outros, isto não parece ter sido o fator crucial que permitiu ao United conquistar a posição de primeiro clube “glamoroso” moderno da Inglaterra. Embora os públicos fossem geralmente grandes imediatamente após Munique, o United passou em geral por variações de público normais mesmo após Munique. Na verdade, a história de Munique pode ter começado a exercer uma influência poderosa na imagem do clube depois que essa imagem foi modelada posteriormente, no final da década de 1960.

(184) A posição particular do clube parece derivar de 3 fatores em ação no período crucial entre 1966-7. Primeiro, o clube beneficiou-se enormemente da publicidade que cercou seus feitos na Copa Européia de Clubes. Quando demoliram o Benfica por 5x1 em Lisboa em março de 1966 eles ganharam enorme publicidade, sintetizada pela manchete do Daily Mirror com uma foto de George Best em um sombrero, com a legenda “El Beatle”. Muitos vêem este momento como definidor da emergência do jogador de futebol como uma verdadeira estrela midiática e o United só poderia beneficiar-se da nova notoriedade do jogador. Novamente, a conquista da 1ª. divisão em 1967 veio em uma época em que, graças ao sucesso da Inglaterra na Copa de 66 e ao rápido crescimento do futebol televisionado, o jogo estava em um pico incrivelmente alto. Acima de tudo, o United era uma equipe brilhante, Best, Bobby Charlton (um herói da copa do mundo particularmente popular) e Denis Law fornecendo três tipos muito diferentes mas poderosos de heróis futebolísticos. Em uma época de futebol crescentemente defensivo, a capacidade do United em vencer a 1ª. divisão com 84 gols, 20 a mais do que o clube mais próximo, trouxe excitação e romance para Old Trafford e outros campos ingleses. Os eventos de 1966-7, portanto, asseguraram ao Manchester United uma popularidade e um status que os revezes futuros somente raramente diminuíram. A desagradável consequência para o United foi que o influxo de novos torcedores incluía uma parcela pequena mas muito badalada na imprensa de hooligans, embora, ironicamente, para alguns torcedores jovens isto apenas aumentasse o apelo do clube junto a eles.

(184-5) A maioria dos outros clubes podia apenas invejar Old Trafford à medida em que eles sofriam para tentar explicar a ausência de público nas suas arquibancadas. Uma série de explicações foi formulada para explicar esse processo. Algumas enfatizam as mudanças na demanda. Em 1961, 91% dos lares britânicos tinha uma televisão e não é surpreendente que a TV, e especialmente o futebol televisionado, tenha sido visto como o pivô do declínio de público. Certamente, seria possível sugerir várias maneiras pelas quais a cobertura de televisão ameaçava o jogo ao vivo. Um argumento era simplesmente que as pessoas poderiam aproveitar o futebol no conforto da sala de estar achando portanto menos interessante ir aos jogos. Outro afirmava que a TV proporcionava aos torcedores de clubes menores um jogo de maior qualidade do que aquele com que eles normalmente dispunham ao vivo (qualidade geralmente realçada por edições criteriosas), encorajando-os a abandonarem as arquibancadas totalmente ou a procurarem um time mais “glamoroso”. Alternativamente, alguns sublinharam o efeito da TV como desfazendo mitos ao invés de criá-los, argumentando que o futebol televisionado tornava o que antes era um esperado programa quinzenal em algo banal, portanto desencorajando o comparecimento aos jogos ao vivo.

(185) É provável que de todas essas variadas formas, e tão simplesmente fornecendo uma forma alternativa de entretenimento no sábado, a TV realmente tenha exercido uma influência em termos da queda de público. Deve-se sublinhar, entretanto, que os “milhões de torcedores desaparecidos” do futebol tinham começado a se ausentar das arquibancadas muito antes que o futebol televisionado houvesse se tornado uma característica do ambiente esportivo. É importante notar também que, em certos momentos do futebol televisionado, os públicos aumentaram; o período imediatamente após o sucesso na Copa do Mundo de 1966 é um exemplo óbvio. Da mesma forma, momentaneamente focalizando um período posterior, os públicos aumentaram a cada ano depois de 1986-7, a despeito do fato de que a cobertura do futebol na TV tenha aumentado grandemente neste período. A TV pode ser parcialmente responsável por estes aumentos somente no sentido de que, em momentos quando o futebol desfrutava de uma imagem positiva na cultura nacional por causa do sucesso da seleção ou por causa de um clube importante, a televisão era capaz de reforçar esta imagem e fazer do comparecimento ao estádio uma escolha razoável. Em outras épocas, o futebol ao vivo e o televisionado sofreram juntos, com o público de ambos caindo no final dos anos 70, por exemplo. Parece que várias e complexas relações existem entre o futebol televisionado e os padrões de público do que simplesmente a televisão prejudicando a presença do público nos estádios.

(185-6) Acima de tudo, a explicação mais forte do ponto de vista da demanda, e provavelmente a mais convincente de todas as explicações, assenta-se no simples fato de que muitas pessoas continuaram a achar outras coisas para fazer em um contexto de uma aumento geral dos padrões de vida e de um concomitante aumento na escolha disponível para os consumidores. A reestruturação do fim de semana tradicional foi um fator importante neste contexto, com a tendência crescente a que o trabalho terminasse na 6ª. feira colocando o jogo de futebol no meio do fim de semana ao invés de permitir que ele funcionasse como um atraente e simbólico início do descanso semanal. Níveis crescentes de posse de automóveis continuaram a exercer um papel importante, também, permitindo todos os tipos de atrações capazes de levar as pessoas para longe de cenários tradicionais, inclusive estádios de futebol. Como notamos no capítulo anterior, o acesso crescente ao transporte privado também permitiu aos torcedores adotar um clube grande de uma cidade vizinha às custas do clube local.

(186) Enquanto uma relativa abundância era sem dúvida responsável pela falta de muitos torcedores, as dificuldades daqueles que não podiam desfrutar desses prazeres não devem ser menosprezadas. A partir do fim dos anos 70, o desemprego certamente exerceu uma influência em termos de público. Os números do desemprego oficial mostram um aumento de 700.000 em janeiro de 1975 para um pouco mais de 3 milhões no início de 1981. Dos 9.7 milhões de torcedores desertando do futebol entre 1977 e 1986, mais de 6 milhões foram perdidos nas três temporadas entre 1980-3, com públicos caindo 2.7 milhões na temporada de 1980-1 quando o desemprego alcançou seu pico. Mesmo alguns clubes de ponta sofreram com isso. A região do Merseyside [Liverpool e Everton] foi fortemente afetada pela recessão e o Liverpool experimentou uma queda de 16% no público em 1980-1, em uma época em que a queda geral na primeira divisão foi de apenas 6%. Como na década de 1930, os torcedores mostraram grande poder de escolha gastando com sabedoria os parcos recursos. Enquanto os jogos mais importantes do Liverpool na 1ª. divisão bem como os jogos da Copa Européia continuaram a lotar Anfield, jogos menos importantes viram o público despencar. À medida em que o alto desemprego tornou-se uma característica central da sociedade britânica, alguns clubes foram autorizados a fornecer descontos para os desempregados, mas para uma significativa minoria de torcedores o declínio das indústrias significava privação de lazer da mesma forma que em muitas outras áreas de suas vidas.

(186) Os fatores ligados à oferta também têm grande importância na discussão acerca da queda do público. O fato de que os torcedores tinham que pagar somas crescentes pelo privilégio de ingressarem em estádios decadentes tem sido visto como importante por uma série de observadores. Os preços cresceram ininterruptamente no período e à medida em que a inflação crescia e os públicos caíam quase continuamente, os clubes aumentavam seus preços tentando recuperar a perda de renda. Em 1983, a entrada mais barata na 1ª. divisão estava entre 2 e 2,5 libras. Para muitos, isso significava somente um aumento real marginal nos custos de entrada, mas era um problema sério para os mal pagos e para os desempregados. Muitos torcedores viram-se pagando mais para frequentar estádios muito mal mantidos e equipados. Enquanto nos anos 60 alguns clubes, principalmente o Manchester United, o Tottenham e o Sheffield Wednesday, tinham investido consideravelmente em novas arquibancadas, ou tinham conscientemente buscado atrair torcedores de classe média através do fornecimento de boxes executivos e de melhorias e mais conforto, muitos estádios haviam mudado muito pouco desde o período entre-guerras.

(187) Os torcedores de futebol, todavia, não devem ser vistos como consumidores ortodoxos e muitos aceitavam as instalações tradicionais e demonstravam pouco entusiasmo por mudanças profundas. Como os anos 80 e 90 demonstrariam, muitos torcedores não queriam lugares sentados como alguns visionários pensavam que eles deveriam querer. Ademais, diretores planejando novas arquibancadas e outras alterações maiores estavam plenamente conscientes da impopularidade dos seus colegas cujos gastos em tijolos e cimento ao invés de jogadores haviam levado ao rebaixamento ou a maus resultados. Embora más condições tenham afastado alguns torcedores, as baixas expectativas dos mesmos e sua aceitação das realidades econômicas do futebol sugerem quem o argumento acerca das “instalações” não deve ser visto como um fator de peso influenciando a presença do público. Significativamente, foi necessária uma legislação parlamentar na forma da lei de 1975 sobre a Segurança nos Estádios, ela mesma originada por um grande desastre ocorrido no Ibrox Park em Glasgow em 1971 que fez com que os grandes clubes começassem a atentar um pouco mais não somente para a segurança mas para toda a questão das instalações. Muitos times das divisões inferiores, com pouco dinheiro e excluídos da lei, simplesmente ignoraram o problema.

(187) A natureza e a qualidade do jogo em si tem se mostrado uma outra área fértil em termos do debate acerca da presença do público, muito dele centrado na crença de que a natureza crescentemente defensiva do jogo foi um motivo pelo qual os torcedores se afastaram. O Football Monthly Digest não foi o único órgão da imprensa a perceber uma ligação crucial entre a perda de 3 milhões de torcedores na temporada 1972-73 e o fato de que a média de gols havia chegado a um recorde negativo. Enquanto a revista talvez estivesse correta em perceber táticas mais sistematicas e previsivelmente defensivas como um desestímulo ao comparecimento regular, estava em campo bem menos seguro ao afirmar que o mero número de gols modelasse os níveis de presença de público. Em um certo momento, a revista comparava os 1160 gols marcados na 1ª. divisão em 1972-3 com os 1724 marcados na prolífica temporada 1960-1. Esquecia-se de mencionar, todavia, que 1960-1 assistiu à maior queda em um ano no público futebolístico do pós-guerra. Analisando-se a questão em uma perspectiva de longo prazo, não há de fato nenhuma relação direta entre os gols marcados e as médias de público. Os públicos alcançaram o auge na década de 1940 quando a média de gols não era tão alta quanto havia sido após a reforma da lei do impedimento em 1925. Então caiu durante toda a década de 1950, época em que a média de gols marcados na verdade subia temporada após temporada. Similarmente, no período 1966-70 e no pós-1986, os aumentos na presença de público ocorreram em épocas em que a média de gols marcados era relativamente baixa.

(187-8) Isto não é argumentar que os torcedores não tivessem senso crítico. Ao contrário, o público era geralmente baixo em jogos entre times fracos (quando os gols do time da casa vinham aos borbotões) e maior contra adversários mais fortes. O sucesso, todavia, era o principal objetivo e embora os torcedores preferissem que ele fosse alcançado através de um futebol maravilhoso e goleador, eles geralmente se contentavam com menos.

(188) Provavelmente a explicação em termos de oferta mais convincente se concentra no hooliganismo e nas mudanças concomitantes na cultura das arquibancadas. Como sempre, as coisas não são simples. Um aumento na atividade de hooligans já estava sendo notada em uma série de estádios londrinos, sobretudo no Chelsea, a partir do começo da temporada de 1967, em um tempo de aumento de público. Novamente, um certo número de clubes com más reputações em termos do comportamento dos torcedores, incluindo o Manchester United, tinham poucos problemas em manter seus níveis de público. Ademais, como discutiremos adiante, o problema dos hooligans não havia alcançado necessariamente a escala que algumas pessoas supunham. Entretanto, há muitos elementos a sugerir que o medo do hooliganismo em potencial juntamente com uma má vontade em relação a uma cultura das arquibancadas bem mais agressiva fosse um fator que levava à diminuição dos públicos. O testemunho oral destes torcedores que abandonaram os estádios, documentação que deveria ser coletada mais sistematicamente pelos historiadores, é significativa. A crescente proporção do público na faixa etária abaixo dos 20 também é vista pela maioria dos comentadores qualificados como uma prova de que os torcedores mais velhos estavam abandonando o que eles consideravam um ambiente menos prazeroso. Não há nenhuma dúvida de que a cobertura super-dramática da mídia desempenhou um papel importante em moldar a visão dos torcedores mais velhos, mas a realidade às vezes era realmente desagradável. Uma atmosfera ameaçadora no transporte público, a presença de um grande número de policiais e o canto de obscenidades em grande escala, o que muitos torcedores de classe trabalhadora tradicional consideravam totalmente ofensivo, afastavam torcedores dos estádios. O racismo aberto manifestado em muitos estádios também era um fator desagradável para muitos. Considerar as tendências após 1985 também pode lançar luz sobre estas questões. É certamente impressionante que os públicos tenham aumentado após 1986 à medida em que a questão do hooliganismo, ao menos no interior dos estádios, tenha se transformado em um problema cada vez menor. Além disso, este aumento do público começou nas divisões inferiores, sobretudo na 2ª., onde a atmosfera tem sido geralmente menos ameaçadora. A partir do início da década de 1970, no contexto das crescentes possibildades de escolha fora dos campos de futebol, o hooliganismo, tanto em termos de mito quanto em termos de realidade, era um fenômeno altamente danoso.

(188-9) É chegada a hora de investigar o tema do comportamento do público de forma mais detalhada. Desordens dentro dos estádios tinham gradualmente aumentado a partir do fim dos anos 50 e a FA foi levada a expressar alguma preocupação no fim de 1961. O problema não era visto como especialmente sério, entretanto, e a decisão do Everton de erguer grades de conteção atrás dos gols em 1963 surpreendeu a imprensa. Em 1967, todavia, o problema já era fonte de atenção e preocupação consideráveis. Na atmosfera de aumento da preocupação do público, formas irritantes mas relativamente inócuas de comportamento que antes eram toleradas, como cantar alto no meio da rua, esbarrões e gesticulação, podiam todas ser percebidas como “hooliganismo” e levar a expulsões e prisões. Dados os problemas de definição que isto origina, nenhuma tentativa vai ser feita de medir o “hooliganismo” durante este período a partir deste ponto do texto. Que baste dizer que tanto o repertório de comportamentos que adquiriu o nome de “hooliganismo” quanto o vigoroso debate público a respeito da sua natureza, causas e soluções foram características centrais da cultura futebolística a partir do fim dos anos 60.

(189) Escrever acerca do hooliganismo moderno é, no mínimo, problemático. O tema tornou-se, no dizer de um escritor, “quase um ramo menor das ciências sociais”, e, como a maioria desses ramos, abriga uma série de escolas de interpretação competindo e em conflito umas com as outras. Ao mesmo tempo, capturar a sua essência exige uma ação sempre equilibrada de confrontar o mito com a realidade, o “medo” manipulado e fabricado pela ordem pública versus o fenômeno tangível. Não há, por exemplo, nenhuma dúvida de que a escala do fenômeno foi exagerada por certos grupos por uma série de razões. Como resultado houve uma hiper-reação dentro da comunidade mais ampla. A visita do Manchester United a York em dezembro de 1974, por exemplo, praticamente fechou a cidade toda, com lojas erguendo barricadas de proteção. Alguns centros de cidades pequenas ficavam quase permanentemente paralisados durante os sábados à tarde, como se percebeu depois que a suposta ameaça diminuíu. Quando o Luton Town baniu os torcedores visitantes dos seus jogos em 1986-7, um shopping center local relatou um aumento de 40% nos consumidores e uma faculdade sentiu-se segura para reabrir suas portas. Mesmo esses medos exagerados, todavia, têm que ser levados em consideração e, na verdade, respeitados: medo do que poderia ser pode ser mais danoso do que a própria realidade, especialmente para certos grupos vulneráveis. Ademais, os problemas reais – batalhas campais entre torcedores rivais, invasões de campo, vandalismo dentro e fora dos estádios – existia de fato e podia ter consequências assustadoras. O que se segue é uma tentativa necessariamente breve de traçar os elementos principais do comportamento e da cultura “hooligan”, mas uma tentativa enraizada na aceitação do fato de que o “hooligan” é uma figura um tanto o quanto fugidia.

(190) Primeiramente, é extremamente difícil traçar uma divisão clara entre o “torcedor normal” e o “hooligan”. Somente uma pequena minoria, exemplificada por aqueles diretamente envolvidos nas chamadas gangues de “super-hooligans” ou “firmas” no início dos 80 é que adotaram a atividade de hooligan como seu objetivo de lazer predominante. Muitos hooligans eram na verdade torcedores comuns, engajados que eram atraídos à violência, seja real ou ritual, em determinados momentos mas que podiam afastar-se igualmente com a mesma facilidade. Havia um continuum no qual as pessoas se colocavam em diferentes estágios das suas vidas, em diferentes jogos e até em diferentes momentos do mesmo jogo. Um jovem embrulhado no seu cachecol a cantar posicionado atrás do gol que havia sido forçado a literalmente atravessar o centro da cidade correndo enxotado pela polícia montada juntamente com todos os outros “hooligans” podia ser um torcedor de verdade, desesperado para evitar confusão, mas agindo daquela forma em parte porque era o que se esperava dele. Alternativamente, “torcedores comuns” podiam engajar-se em comportamentos que embora não necessariamente definidos como “hooliganismo” eram quase certamente igualmente anti-sociais. O abuso racial, como os xingamentos racistas, imitação de símios e arremesso de bananas, que apareceram em meados da década de 1970 não eram (e não são) privilégio exclusivo dos hooligans.

(190) O estilo e o comportamento dos hooligans não permaneceram estáticos. Cada sucessiva geração adotava e/ou estabelecia um estilo de vestimenta distintivo. Os skinheads (carecas) predominavam no fim dos anos 60, mas pela metade da década seguinte as gangues da arquibancada se caracterizavam por cabelos longos, uso de sinalizadores e cachecóis embrulhando todos os membros possíveis [sem trocadilho, por favor!]. Nos anos 80, estilos mais espertos, menos conspícuos [i.e. que não chamavam tanta atenção], em parte exibição de moda, em parte uma tentativa de evitar a vigilância cada vez mais sofisticada da polícia, tornaram-se a norma, levando à alcunha de “soccer casuals” utilizada por e para definir várias gangues. A partir de 1979, alguns grupos começaram a adotar uma mentalidade virulentamente racista. Isto foi encorajado por organizações neo-fascistas que viram os terraces como um campo promissor de recrutamento após sua fracassada tentativa de progredir na eleição geral de 1979 [que elegeu Margaret Thatcher]. O nacionalismo extremista resultante já tinha se prenunciado quando torcedores ingleses começaram a viajar pela Europa seguindo seus clubes na década de 70. Ele tornou-se ainda mais aberto à medida em que, com as rivalidades inter-clubes temporariamente esquecidas, números significativos de jovens torcedores ingleses passaram a seguir a seleção no exterior a partir do início dos anos 80.

(190-1) A maioria dos comentaristas alega que a vasta maioria daqueles envolvidos no hooliganismo eram jovens brancos provenientes de forma desproporcional dos grupos sócio-econômicos 4 e 5 [classes mais pobres]. Um levantamento com 497 hooligans condenados feito em 1968 mostrou que 41.4% vinham de famílias de trabalhadores sem qualificação, com mais 22.5% de famílias de trabalhadores semi-qualificados, enquanto uma pesquisa da Leicester University com 519 indivíduos no período entre 1960 e a metade dos anos 80 revela um quadro quase idêntico. Muitas tentativas foram feitas de se explicar o hooliganismo a partir deste reconhecimento de que pertencer a um setor relativamente pobre e carente da classe trabalhadora tinha um efeito no comportamento, mas o significado deste perfil social é interpretado de diferentes maneiras.

(191) Um trabalho pioneiro importante feito pelos sociólogos Ian Taylor e John Clarke, ambos influenciados pela teoria marxista das sub-culturas muito em voga entre aqueles que estudavam as culturas jovens “desviantes”, tratavam o hooliganismo como um “movimento de resistência proletária”. Este enfoque enfatizava a novidade do hooliganismo e o via como uma tentativa consciente por parte de um setor carente da classe trabalhadora no sentido de reivindicar um esporte em que uma forte tradição de um público ativo e envolvido estava sendo crescentemente canalizada para formas passivas de consumo à medida em que a televisão e certos clubes de elite se articulavam para vender o jogo como espetáculo. Taylor e outros escritores dessa corrente, especialmente Stuart Hall, também enfatizavam até que ponto setores da mídia e do aparelho de Estado manipulavam a questão dos hooligans visando angariar apoio para programas políticos autoritários. As idéias centrais de alguns destes argumentos hoje em dia parecem bastante improváveis. A pesquisa histórica demonstrou até que ponto este tipo de interpretação exagerava a novidade do fenômeno dos hooligans e eventos subsequentes demonstraram que o “aburguesamento” do jogo era ainda muito incipiente em 1969. Isto coloca certa dúvida em termos da hipótese da “resistência”, ainda mais enfraquecida pela probabilidade de que muitos hooligans tenham sido atraídos para o futebol pela primeira vez durante a onda de entusiasmo que se seguiu à vitória inglesa na Copa de 66, e ingressaram no futebol sem muita idéia da sua história e da sua cultura própria. É bem mais provável que estivessem certos no que diz respeito ao uso do hooliganismo por parte de políticos de centro-direita e por determinados jornalistas. Acima de tudo, Taylor e outros pioneiros estudiosos desta área merecem um reconhecimento por terem feito uma tentativa de fornecer uma explicação racional para alguma coisa que a imprensa popular e as autoridades do futebol desprezavam com o uso fácil de expressões como “animais” e “bárbaros”.

(191-2) Mais recentemente, uma interpretação sociológica alternativa foi proposta por Eric Dunning e seus colegas da University of Leicester. Ao mesmo tempo em que rejeitam fortemente a noção do hooliganismo como um movimento de resistência, eles, também, enfatizam a origem social da maioria dos hooligans. Baseando-se na noção de “processo civilizador” associada ao trabalho de Norbert Elias, eles afirmam que os hooligans foram encontrados sobretudo em um estrato da sociedade que não adotou a “revolução dos costumes” que, desenvolvendo-se durante séculos, ensinou códigos de comportamento em que a ordem e o decoro ocupam um lugar de destaque. Eles argumentam sobretudo que o hooliganismo está estabelecido em uma “sub-cultura muito enraizada de uma masculinidade agressiva” que é predominantemente, embora de forma alguma exclusivamente, associada a homens das camadas mais pobres da classe trabalhadora. É uma sub-cultura que celebra noções muito estreitas, rígidas e exclusivas de localidade, comunidade e nação, noções que envolvem uma mistura ambivalente de desprezo e medo diante de alguém ou de algo que seja “diferente”, “estrangeiro” ou “estranho”. Em um sentido, portanto, os hooligans são vistos como pessoas que levam a um extremo a mentalidade típica dos torcedores.

(192) A “Leicester School”, cujo trabalho foi precariamente resumido aqui, tem sido extremamente influente nos últimos anos, embora alguns críticos, especialmente aqueles trabalhando no interior da tradição antropológica, tenham reivindicado que seu trabalho exagera os níveis de violência real efetivamente presentes e localiza o hooliganismo em um estrato social muito restrito.

(192) Existe, todavia, consenso entre estas escolas conflitantes em termos da questão da cobertura da imprensa. Embora seja tolo acusar a imprensa de criar o problema, a cobertura sensacionalista e uma tendência a focalizar mais o público (e seu mau comportamento) do que o jogo resultaram numa profecia autocumprida e no exagero da extensão do problema. A cobertura da imprensa britânica tem sido comparada desfavoravelmente com aquela existente em outros países. Em fins dos anos 60, por exemplo, setores da imprensa passaram rapidamente da celebração tradicional da amigável exuberância dos públicos ingleses à condenação histérica da cultura das arquibancadas. Isto deu ao jogo uma imagem negativa e despertou o interesse de pelo menos alguns outros jovens cuja propensão à violência poderia ter encontrado outros canais de expressão. A imprensa dinamarquesa, inversamente, escolheu celebrar a atmosfera carnavalesca e lamentar os incidentes de violência real. Eles cunharam o termo “roligan” para distinguir o barulhento mas pacífico torcedor do seu colega mais ameaçador. Isto teve a vantagem de inibir setores inteiros do público de serem classificados negativamente como hooligans e pode ter ajudado a limitar o problema da desordem. A imprensa britânica, em sua maioria sempre ansiosa por incorporar o hooligan no catálogo dos “demônios populares” jovens que pareciam refletir o declínio da fibra moral de uma nação pós-imperial, nunca davam uma chance a esta estratégia.

(192-3) Da mesma forma que a mídia, o mundo do futebol, com algumas exceções, mostrou pouca disposição em considerar o fenômeno do hooliganismo de forma equilibrada e racional. O problema era sempre atribuído “à sociedade”, como se o futebol existisse em um casulo apartado de tudo. “Hooligans”, sempre mal definidos, eram invariavelmente etiquetados como “adolescentes problemáticos” ou similares e aqueles que buscavam explicar seu comportamento eram depreciados como “estudiosos de cabeça” ou, ainda pior, “especialistas”. Aqui existia uma poderosa expressão do isolamento e do anti-intelectualismo que predominava nos órgãos adminstrativos do futebol. Talvez isso fosse apenas um reflexo de uma tendência mais ampla da sociedade inglesa de então. O establishment esportivo, todavia, parece ter sentido sua masculinidade ameaçada pela necessidade de participar de todo e qualquer tipo de agenda liberal.

(193) Lá pelo fim dos anos 80, o policiamento intensivo e altamente tecnológico, as políticas de segregação [separação] de torcedores e, acima de tudo, mudanças fundamentais na cultura dos terraces tornaram o problema bem menos frequente, ao menos no interior dos estádios ingleses. Talvez isso tenha sido bom para os acadêmicos assim como para o futebol. O hooliganismo provavelmente tomou mais tempo daqueles interessados em estudar o futebol contemporâneo do que qualquer outro tema. Por um lado, isso é bastante apropriado. A sub-cultura hooligan é em si mesma um importante fenômeno social, enquanto o seu impacto tanto no futebol quanto naqueles próximos aos estádios foi traumático e danoso. Por outro lado, tentativas de controlá-lo levaram a consideráveis embora infuficientemente reconhecidas questões relacionadas às liberdades civis individuais. Um bom número de jovens torcedores sem folha criminal e nenhuma intenção de ter uma, viram-se tangidos feito gado em meio a grupos forçados a trotar longas distâncias da estação de trem até os estádios por que eles tinham decidido apoiar seu time fora de casa. Em algumas das maiores operações policiais, os torcedores da casa que nem mesmo desejavam ficar no setor de arquibancada que o elemento “hooligan” mais jovem, mesmo assim eram revistados em busca de armas antes de entrar no estádio. Um sistema de cartão de identificação quase foi implementado no final dos anos 80 e o justo, tanto quanto o pecador, passaram a estar sob a vigilância do circuito fechado de televisão (câmeras de vigilância). O futebol era, naquele momento, tanto um espaço de conflito entre o Estado e um setor da jovem classe trabalhadora quanto um laboratório forçado para estilos de vigilância e policiamento que recebiam forte apoio de setores da sociedade favoráveis à lei e à ordem. Em todos estes sentidos, o fenômeno do hooliganismo estava bem perto do centro da cultura social e política da Inglaterra nesse tempo.

(193-4) Seja qual for a sua importância, o perigo é que nós percamos de vista o ponto fundamental de que os hooligans, mesmo frouxamente definidos, eram uma parte muito pequena do conjunto de várias centenas de milhares de pessoas que regularmente iam a jogos profissionais e de milhões de outros que acompanhavam o futebol. Por volta do início dos anos 80, o percentual de prisões efetuadas em jogos de futebol estava no nível muito baixo de pouco menos de 5 para cada 10.000 [ou seja, 10 pessoas para um público de 20 mil, por exemplo]. Obviamente, tais números não dão conta da atmosfera às vezes desagradável existente em algumas partidas ou os gestos, insultos e olhares desafiadores que eram produtos típicos da vida dos terraces desde o início dos anos 70. Da mesma forma, é preciso reconhecer que o problema dos hooligans no final do século XX era de dimensões mais significativas do que suas manifestações primeiras no final do século XIX e início do século XX. O enorme aumento do número dos que viajavam para jogos fora tornava isto quase inevitável. Não obstante, a maioria dos torcedores era totalmente inocente e não praticavam nenhum “crime” além de gritar e xingar, que sempre foram parte essencial da torcida ativa. Em muitos clubes, particularmente os das divisões inferiores, uma cultura hooligan era praticamente desconhecida, ou em uma escala que se tornava cômica, desde que suas erupções ocasionais pudessem ser evitadas. Mesmo nestes campos onde os “ends” [arquibancadas localizadas atrás do gol] eram mais lotados e mais voláteis, os jovens torcedores aumentavam o colorido e a atmosfera dentro da qual o jogo era praticado.

(194) A excessiva concentração no hooliganismo também obscurece o fato de que os estilos mais antigos de torcer, embora modelados em padrões modernos de cultura popular, existiram durante todo este período e temperavam os elementos mais agressivos da cultura das arquibancadas. O mais famoso exemplo é fornecido pelo famoso Spion Kop de Liverpool [parte da arquibancada atrás de um dos gols do Liverpool, o terrace mais famoso da história do futebol inglês]. Abrigando quase 30 mil torcedores debaixo de um teto que amplificava os níveis de barulho a um ponto amedrontador, o Kop tornou-se provavelmente o mais celebrado “end” do futebol mundial. Foi durante a temporada 1961-2 quando o clube estava subindo da 2ª. divisão que os torcedores começaram a desenvolver uma coleção de cantos ritmados que logo iriam tornar-se comuns entre os públicos da Inglaterra e, na verdade, da Europa. Em 1963-4, os koppites passaram a cantar músicas e versões de músicas do Merseybeat que dominavam a música popular britânica e norte-americana desta época. Em particular “You’ll never walk alone”, originalmente do musical Carousel, mas que havia sido regravada pelo grupo local Gerry and the Pacemakers no outono de 1963, tornando-se o hino do Liverpool e a maior canção inglesa de futebol. O Kop foi mitificado por Liverpudlians [pessoas que nasceram em Liverpool] e por forasteiros em busca de “autênticos” valores de classe trabalhadora. Ambos os grupos ignoravam suas características menos saborosas. Garth Crooks é apenas um doos jogadores negros que se lembra de ter sido xingado por alguns dos kopites e o Liverpool, assim como a maioria dos outros clubes maiores, tinha um grupo de hooligans da pesada. Acima de tudo, entretanto, durante todo o período, o Kop genuinamente parece ter sido um espaço de sagacidade, cor e espírito esportivo. É claro que não era o único lugar onde essas qualidades poderiam ser encontradas. O futebol só se recuperou da sua má reputação na imprensa nos anos 80 em boa parte graças a esta reserva de humor, paixão e comportamento apenas moderadamente rude.

[iii] The media (195-200):

[iv] Football as business (200-203):

[v] Football, politics and society (203-206):

[vi] 1985 – ‘Annus horribilis’ (206-208):

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Capítulo 7 - Resumo-tradução (COMPLETO)

Esquema de

RUSSELL,Dave

(1997) Football and the English – A social history of Association Football in England, 1863-1915. Preston: Carnegie Publishing. Capítulo 7: The Glamour Game, 1961-1985. pp. 156-180.

[i] Prólogo (156):

- Em termos sociais e econômicos, o período entre 1961-85 não forma um bloco coerente: ocorreram mudanças fundamentais em todos os aspectos da sociedade inglesa entre as épocas de Macmillan e Thatcher.

- Em termos futebolísticos, também, podemos dizer que o final dos anos 70 e os anos 80 formam um período distinto e bastante problemático.

- Há, todavia, uma certa característica deste quartel de século que o torna um foco útil. Uma nova era foi iniciada com a abolição do teto salarial e uma outra se apresentava como resultado da crise de meados dos anos 80.

- Este capítulo trabalha essencialmente com os aspectos da história do futebol que se relacionam à organização, administração e do jogo propriamente dito neste período; o próximo capítulo irá concentrar-se na relação entre o jogo e a sociedade mais ampla.

[ii] Running the game (156-159)

(156) Apesar de todos as mudanças e problemas envolvendo o futebol professional, a FL permaneceu bastante estática. Ela até chegou a sugerir uma reforma em 1961, que dentre outras coisas previa uma FL com 5 divisões de 20 clubes (sendo a 4ª. divisão dividida em norte e sul) com promoção e rebaixamento automáticos de 4 clubes.

(156) Outra característica: clubes que pedissem reeleição para a FL duas vezes seguidas eram automaticamente rebaixados. [vou explicar em sala]

(156) O plano não foi aprovado: em 1963 ficou a 8 votos de alcançar a maioria de 3/4, o que é irônico porque uma das mudanças propostas era a diminuição do quorum para mudanças para 2/3.

(157) Em 1968 o governo apontou uma comissão para estudar o futebol e propor mudanças, rejeitadas pela direção da FL. Em 1983 a própria FL aponta outra comissão (chefiada pela mesma pessoa, Sir Norman Chester de Oxford), mas rejeita as sugestões novamente.

(157) As mudanças eram dificultadas pela mistura entre: oposição institucional às críticas externas, recusa em admitir problemas atuais e potenciais, respeito genuíno pelas estruturas e tradições existentes.

(157) O fato é que quando a “reestruturação” tornou-se o tema central em 1985, os clubes que apoiavam uma “Super-Liga” dissidente podiam legitimar seu radicalismo (que na verdade escondia ambições) a partir de uma longa e profunda frustração com o conservadorismo da Football League.

(157-8) Ocorreram pequenas mudanças:

i. Introdução da League Cup [Copa da Liga Inglesa] em 1960-1, de início sem prestígio junto aos grandes clubes mas que pouco a pouco se firma; [hoje é a chamada Carling Cup]; FOI ESSA COPA QUE O GLORIOSO OXFORD UNITED GANHOU EM 1986, DERROTANTO O QUEENS PARK RANGERS EM WEMBLEY!!!

ii. Muitas outras competições foram criadas no período, mas a única que ficou foi a Associate Members Cup em 1983-4 que mudou de nome várias vezes de acordo com o patrocinador (era Auto Windscreens Shield na temporada 1995-6). Nela tomavam parte as equipes da 3a. e 4a. divisões.

iii. A reforma dos procedimentos de reeleição para a FL [explicarei em sala] avançaram no período: a FL admitiu que até então havia prejudicado non-league clubs interessados em subir. Em 1979 formou-se a New Alliance Premier League, na verdade uma 5a. divisão [onde provisoriamente se encontra o glorioso Oxford United]; a promoção e o rebaixamento automáticos entre a FL e as divisões abaixo dela, todavia, só se tornaram automáticos em 1987, criando efetivamente a pirâmide do futebol inglês.

(158) Outras mudanças do período:

i. Uma das mais populares foi a permissão para uma substituição (somente por contusão) em 1965;

ii. Uma das mais impopulares foi a permissão para que os clubes utilizassem gramados artificiais em 1981; somente 4 clubes utilizaram esse tipo de gramado e o último foi removido em 1993.

iii. Um sistema de 3 sobem, 3 descem, automaticamente, foi adotado em 1973;

iv. Adoção dos 3 pontos por vitória em 1981-2, supostamente para estimular o futebol ofensivo;

(158-9) Em termos da FA (Football Association):

i. Finalmente o futebol dominical foi abençoado em 1960 e criou-se uma Copa para times amadores dominicais em 1964-5.

ii. Em 1974 a FA permitiu que jogos da FA Cup e da FL fossem realizados aos domingos para compensá-los pela disrupção causada pela semana de 3 dias que resultara do conflito entre o governo e os eletricitários e mineiros.

iii. Somente em 1981 a FA sancionou os jogos da FL aos domingos e somente em 1983 permitiu que os jogos da FA Cup fossem jogados no dia reservado ao Senhor.

iv. A FA estava crescentemente disposta a aceitar o futebol feminino. Atendendo a pressões vindas da UEFA, formou-se um comitê conjunto entre a FA e a recentemente formada Women’s FA [entidade independente em relação à FA] para estudar e regular alguns aspectos relativos ao futebol feminino.

v. Uma mudança notável foi o fim da distinção entre amadores e profissionais em 1974, finalmente abandonando a tarefa de tentar policiar os pagamentos feitos a times nominalmente amadores;

(159) As relações entre FA e FL continuaram tensas. Um ponto de discórdia era a falta de interesse dos clubes em liberarem jogadores para a seleção da Inglaterra; as instruções da FA normalmente irritavam os dirigentes da FL.

(159) Em 1964-5, 87 clubes da FL [quase todos os 92, portanto] ameaçaram abandonar a FA após serem solicitados a assegurar que seus jogadores amadores (quando os havia) não recebessem nada além do reembolso de despesas de viagem. Que uma questão tão irrisória tenha despertado uma resposta tão dramática indica uma relação bem conflituosa. A FA recuou na exigência, mas aos poucos ia-se abrindo um abismo que iria redundar na ruptura de 1991 [criação da Premier League]

[iii] The game (159 - 163)

(159) A partir da metade dos anos 6o, a primeira geração de managers modernos e seus coaches estava firmemente no controle do que acontecia no campo, o que levou a mudanças significativas na forma em que o futebol passou a ser jogado.

(159) O sucesso da Inglaterra na Copa de 66 usando o 4-3-3 levou à adoção deste modelo durante alguns anos. Nos anos oitenta os estilos variavam bastante, desde o jogo de posse de bola e passes do Liverpool até as modalidades de lançamentos longos [chutões para frente diríamos nós, brasileiros] em que a bola era posta na área do adversário o mais rapidamente possível.

(159-160) A partir do início dos anos 60 o futebol se tornou mais defensivo. Entre 1955 e 62 as médias de gols eram altíssimas, com várias equipes conseguindo marcar mais de 100 gols em uma temporada.

(160) A partir de 1961-2 o declínio no número de gols marcados foi constante (ver quadro 3 – Gols marcados na Primeira Divisão – 1960-1976), tanto na Primeira Divisão quanto nas outras divisões da FL.

(160-1) Não surpreende que a nova geração de managers tenha enfatizado as táticas defensivas, predominante sobretudo a partir de 1965-6, pois suas análises quantitativas demonstravam que a posição na tabela dependia mais das qualidades defensivas do que ofensivas: em 1961 o Newcastle foi rebaixado marcando 86 gols.

(161) No “futebol moderno” não valia mais a pena ganhar em casa por 10x4 para em seguida perder for a por 2x5 ou 0x4, o que aconteceu com o Spurs no outono de 1958.

(161) Uma série de mudanças táticas ocorreram, levando praticamente todos os jogadores a defenderem e a negarem espaços no meio de campo aos adversários.

(161) Apareceram as táticas basicamente defensivas: 4-3-3, 4-4-2, 4-5-1.

(161) Os métodos ultra-defensivos eram utilizados sobretudo nos jogos fora de casa: em casa os managers adotavam táticas mais ofensivas para contar com o apoio da torcida.

(161) Isso não significa que o futebol tenha piorado, embora às vezes algumas exibições defensivas fossem dolorosas de assistir. De qualquer maneira agora o futebol era um jogo diferente, altamente profissional em termos de planejamento, treinamento e disciplina.

(162) A partir de fins dos anos 50 houve muito debate acerca do espírito com que o futebol era jogado. Muitos afirmavam que com as crescentes recompensas financeiras, os jogadores haviam se tornado mais “cínicos”, mais dispostos a questionar os juízes, fazer cera, desrespeitar as distâncias da barreira e fazer faltinhas deliberadamente. O declínio do número de gols marcados também foi usado como argumento por aqueles que afirmavam um declínio do futebol. Lamentava-se o uso sistemático das malandragens de diversos tipos.

(162) Analisando bem, estas malandragens, em primeiro lugar, são difíceis de medir, o que torna a comparação entre as épocas impossível. Ademais, elas sempre estiveram presentes no jogo: em 1928 um jornalista presente à final da FA Cup elogia um zagueiro do Blacburn Rovers por seus lançamentos longos, defesa segura e cera para dificultar o empate do Huddersfield. E ele estava realmente elogiando a cera como um artifício útil (e aceito) em um momento de sufoco.

(162) Muitos que trabalharam no futebol entre 1920-60, todavia, acreditavam que estas táticas sujas eram coisa da “nova geração”. Se esse for o caso, isso sugere que tinham havido interessantes mudanças tanto no jogo quanto na sociedade inglesa.

(162) Stephen Wagg, por exemplo, sugere que a partir dos anos 50 a vida na Inglaterra tornou-se mais competitiva e que à medida que o mundo de negócios britânico aboliu o cavalheirismo o mesmo teria ocorrido no futebol. Ele ainda acrescenta que o novo vocabulário tecnocrático do “profissional” fazendo seu “trabalho” justificava esse rompimento com o espírito e às vezes com a letra da lei [i.e. das regras].

(162) Seja ou não válida esta interpretação, pode-se oferecer uma interpretação mais positiva. É possível que a nova ética profissional tenha levado a uma atitude diferente perante as jogadas violentas. Aqui estamos em terreno extremamente subjetivo, dependendo dos testemunhos de ex-jogadores do período pré-guerra, que podem ser exagerados. Mas um jogador considerado “duro” nos anos 30 achava que os jogadores da década de 60 eram frouxos. Na verdade, dizia-se com frequência nas décadas de 1950 e 60 que o jogo realmente violento e perigoso havia declinado. A hipótese de Russell: a emergência da “malandragem” era uma resposta da nova geração de profissionais que respeitavam demasiadamente seus colegas para se permitirem o uso excessivo de jogadas perigosas, buscando compensação em outros métodos.

(162-3) Há pouca dúvida de que o jogo se tornou menos abertamente físico. A evidência estatística, à primeira vista, poderia sugerir o contrário, com o aumento do número de expulsões e advertências em jogos profissionais: de 942 em 1970-1 para 3.968 em 1981-2. Todavia, estes números são um indicador ao mesmo tempo das mudanças de mentalidade dos administradores do jogo [i.e. tornando-se mais rígidos diante da violência] da mesma forma que são uma medida objetiva das faltas.

(163) Esta hipótese é demonstrada pelo seguinte: em temporadas quando a FL e a FA procuraram responder a determinados incidentes, o número de advertências e expulsões aumentou (e.g. campanha contra a “falta profissional” em 1982-3).

(163) Ou seja, nesse caso não se tratava dos jogadores terem se tornado mais violentos e sim da alteração dos parâmetros do que constituía um comportamento aceitável.

(163) É também possível que os estilos de arbitragem tenham se modificado. Em uma época em que os comentaristas estavam clamando por claras demonstrações de disciplina em todas as áreas públicas e quando, no mundo do futebol, as relações entre a violência dentro e fora do campo eram estabelecidas com frequência, os árbitros foram forçados a adotar um procedimento mais “formal” (i.e. marcando “tudo”). Neste sentido, as forças sociais bem como as forças esportivas ditavam o estilo do futebol.

[iv] Football’s geography (163-171)

(163) A FL praticamente completou sua colonização da Inglaterra nos anos 60 e 70. Três condados pela primeira vez ganhavam representantes na FL com as entradas do Oxford United (1962), Cambridge United (1970) e Hereford United (1972).

(163) A questão principal a ser debatida aqui refere-se aos padrões de sucesso e fracasso. Há duas características centrais do período a serem examinadas: a força crescente dos clubes do sul e a dominação por parte dos clubes de grandes cidades, tendências que alcançaram seu zênite em 1987-8 (ver tabela 4 à página 164).

(164) Desde a II GM que os clubes do sul representavam cerca de 30% da Primeira Divisão. A partir dos anos 80 passam a representar 50-60%.

(164) À primeira vista, esta importante mudança pode ser atribuída às mudanças econômicas do período, quando há o fortalecimento econômico do sul em comparação com o resto do país.

(164) Russell acha que esta relação não é tão indiscutível assim. Afinal, alguns clubes que subiram para a Primeira Divisão nos anos 70 e 80 o fizeram graças a diretores ou presidentes vindos de fora ou mesmo figuras locais proeminentes, ou seja, graças a um patrono e não devido à geração de capital por parte da comunidade de negócios local. Exemplos: Elton John financiando a ascensão do Watford da 4ª. divisão em 1977-8 para o 2º. Lugar na 1ª. divisão em 1982-3 e Robert Maxwell salvando o [glorioso] Oxford United da falência [calúnia!!!] em 1982 e utilizando seus recursos para fazer o clube subir da 3ª. para a 1ª. divisão em temporadas consecutivas a partir de 1983-4.

(164) Ao mesmo tempo, poucos dos clubes sulistas recém-chegados à 1ª. divisão atraíram grandes públicos, portanto não é possível falar de clubes fazendo progresso rápido devido à riqueza gerada nas bilheterias por uma população bem de vida.

(164) Pode ser o caso que os clubes sulistas, localizados muito perto de convenientes fontes de capital, tendessem a levantar dinheiro mais facilmente que seus colegas do norte.

(164) As vantagens econômicas também podiam ser traduzidas em vantagens culturais: talvez Londres e o sul fossem uma localização mais atrativa para jogadores do que alguns destinos no norte. Todavia, relações claras entre uma prosperidade sulista e a ascensão dos clubes sulistas são difíceis de estabelecer. Isto só poderia ser comprovado com uma análise detalhada clube a clube, focalizando não somente elementos sociais e econômicos, mas também coisas como a qualidade da rede de olheiros e, em particular, examinando se os clubes do sul tinham uma habilidade especial em atrair o número emergente de jogadores negros.

(165) Em termos de sucesso no nível mais alto, os clubes do norte e das Midlands (centro da Inglaterra) continuavam a ser dominantes, apesar de um significativo sucesso dos clubes do sul na FA Cup (17 vezes entre 1960-95 contra apenas 9 campeonatos da FL no mesmo período).

(165-6) Muitos dos clubes sulistas que conseguiram chegar à 1ª. divisão tiveram pouco sucesso e/ou ficaram lá por pouco tempo logo caindo para as divisões inferiores (Millwall, Portsmouth, Watford e Oxford United)

(166) O segundo traço marcante do período pós-61 é a dominação dos clubes de grandes cidades em detrimento dos clubes de cidades menores. Entre 1962 (Ipswich) e 1995 (Blackburn), nenhum clube representando uma cidade com menos de 200.000 habitantes venceu o campeonato da 1ª. divisão. E em 1995 o Blackburn era uma exceção que confirmava a regra, pois foi ajudado pela enorme injeção de capital feita pelo milionário Jack Walker. Na verdade, apenas duas cidades com menos de 300 mil habitantes, Derby e Nottingham, conseguiram sucesso nesse período. Os clubes de cidades menores não somente não alcançaram um sucesso maior mas nem mesmo conseguiram se manter no nível mais alto, caindo para divisões inferiores (ver tabela 5 nesta página).

(166-7) No caso do declínio dos clubes do Lancashire (antiga região têxtil), houve variações e Russell não aceita estabelecer relações diretas entre o declínio econômico da região e o mau desempenho dos clubes ali localizados. Ele acha que esse foi um fator, mas que deve ser associado também a fatores mais especificamente futebolísticos.

(167-8) Como foi demonstrado no capítulo 2, os diferenciais de população sempre influenciaram no sucesso futebolístico. Todavia, uma vez que a estrutura econômica do futebol foi alterada com a abolição do teto salarial e a reforma do sistema de retenção e transferências, o tamanho da população base necessária à obtenção de sucesso cresceu enormemente.

(168) Os clubes de cidades grandes sempre levaram vantagem nessa área, mas não tanto quando havia teto salarial e um sistema de retenção e transferências muito rígido. Em um mercado livre os clubes de cidades grandes passaram a reinar supremos. Sua torcida mais numerosa passou a ser a base de finanças seguras e do sucesso dentro de campo.

(168) Os clubes de cidades-médias do Lancashire e de outras regiões conseguiram sobreviver em boa parte dos anos 60 graças ao seu capital acumulado de feitos históricos, que mantinha um público razoável e os tornava atrativos para vários jogadores.

(168) A partir de meados da década de 60 e nos anos 70, todavia, a facilidade de transporte para Liverpool e Manchester, combinada ao abismo crescente entre as performances de clubes de cidades grandes e os restantes, aceleraram a diminuição do apoio dos torcedores.

(168) Os clubes menores foram capturados em uma espiral de declínio. Uma vez tendo escorregado ladeira abaixo para a 3ª. e a 4ª. divisões, o consequente colapso de público tornava o abismo entre eles e os clubes de cidades maiores impossível de transpor. Agora clubes que já haviam sido os grandes nomes do futebol inglês tornavam-se simplesmente fornecedores de jogadores para os clubes mais ricos. Só a chegada de patronos extremamente ricos poderia alterar esta situação.

(168) Definindo clube de grande cidade: locais com população maior do que 400.000, ou seja, além de Londres, Birmingham, Liverpool, Sheffield, Manchester, Leeds e Bristol. Ora, é claro que nem todos os clubes de cidades grandes tem sido clubes grandes nas últimas décadas. Bristol, por uma série de fatores (força local do rugby, divisão dos torcedores entre dois clubes, posição de relativo isolamento geográfico dificultando a atração de jogadores), é o exemplo clássico.

(168) Da mesma forma, um certo número de clubes londrinos baseados em subúrbios ou no que antes haviam sido distritos algo isolados de classe operária jamais se estabeleceram como clubes vencedores: Crystal Palace, Fulham, Brentford e Millwall.

(168-9) O que é mais interessante é que até mesmo um certo número de clubes de cidades grandes que passaram um bom período na 1ª. divisão e que são vistos como “clubes grandes” têm retrospectos bastante limitados.

(169) A verdade é que apenas um pequeno número de clubes de cidades grandes têm sido bem sucedido na era pós-teto salarial (ver tabela 6, nesta página)

(169) Alguns clubes com enorme potencial derivado da sua torcida atual e em potencial não desenvolveram todo o seu potencial. Chelsea [o autor escreve em 1995, antes da chegada de Abramovich e de José Mourinho], Sheffield Wednesday e talvez o Aston Villa (mesmo que tenha alcançado sucesso em 1980-1 – 1ª. divisão e em 1981-2 – copa européia) sejam os melhores exemplos. Sem falar no Birmingham City que só ganhou uma Copa da Liga em 1963 e do Sheffield United cuja maior honraria foi vencer a FA Cup em 1925.

(169) Tudo isso levanta a questão da verdadeira fórmula para o sucesso futebolístico. Por que o Liverpool, o Manchester United e o Arsenal foram tão bem mais sucedidos do que o Chelsea, o Sheffield Wednesday e o Manchester City, clubes que compartilham com eles das mesmas vantagens sociais, demográficas e econômicas ?

(169-171) Resposta:

i. O simples peso da tradição histórica parece ter desempenhado um papel central. Com a exceção do Leeds United e em menor escala do Tottenham, os clubes mais bem-sucedidos no pós-61 têm um histórico de sucessos bastante longo, datando do período pré-1914 no caso de Liverpool, Everton e Manchester United e dos anos 30 no caso do Arsenal.

ii. A sensação resultante da “grandeza” do clube, que combina uma aura quase mística com a expectativa realista de que estes clubes irão continuar a experimentar sucesso, provou ser um poderoso incentivo para atrair torcedores e recrutar jogadores.

iii. Por outro lado, clubes outrora poderosos ou clubes de grandes cidades potencialmente poderosos que passaram por longos períodos sem sucesso consistente (Aston Villa, Chelsea, Sheffield United, Sheffield Wednesday, Manchester City) têm geralmente conseguido manter a lealdade dos torcedores, mas não têm sido capazes de segurar managers e jogadores chave. Seu sucesso após 1961 têm sido ou muito limitado ou, no caso do Manchester City entre 1967-71 e do Chelsea entre 1965-72, confinado a um breve período.

iii. O ingrediente crucial, todavia, permanece sendo a habilidade de certos managers e comissões técnicas de conseguir os melhores resultados dos seus jogadores. A base populacional, o dinheiro e a tradição são fatores importantes, mas em si não são uma garantia de sucesso. Como qualquer torcedor sabe, os managers podem literalmente refazer ou quebrar um clube.

(171) Neste período, quatro retrospectos destacam-se em termos de managers:

i. O reinado de Matt Busby no Manchester United entre 1945-69 que levou à montagem de 3 equipes campeãs distintas;

ii. A famosa dinastia do Liverpool: Bill Shankly, Bob Paisley, Joe Fagan e Kenny Dalglish entre 1959-1991, trazendo sucesso contínuo e sem igual;

iii. Don Revie sendo bem sucedido em fazer do Leeds um clube de elite (i.e. de 1ª. divisão);

iv. Talvez o mais impressionante de todos: Brian Clough, que conseguiu o campeonato da 1ª. divisão com dois clubes diferentes (Derby em 1972 e Nottingham em 1978), ambos clubes pouco importantes e não-provenientes de cidades grandes.

(171) A grande importância dos managers é ilustrada pelo fato de que os clubes menos bem sucedidos trocaram de manager muito mais vezes do que os bem sucedidos: o Liverpool teve apenas 6 managers entre 1959-1995, o Manchester United e o Arsenal tiveram 7, contra 13 do Aston Villa, 14 do Chelsea e do Sheffield Wednesday e 16 do Manchester City.

[v] Players (171-180)

(171) Nos anos 70 1,5 milhão de rapazes e homens jogavam futebol em um nível ou outro. Como sempre, apenas a parcela mais ínfima tinha habilidade, dedicação e sorte de se tornar profissional.

(171) À medida em que a recessão se abateu sobre a Grã-Bretanha no início da década de 1980 e os clubes começaram a dispensar para diminuir despesas, esta fração tornou-se menor do que nunca, com um recorde negativo de apenas 1.575 profissionais registrados em clubes da FL em 1983 contra 4.000 no boom do final dos anos 40.

(171-2) O governo conservador foi muito criticado pela criação do Youth Training Scheme (YTS) em 1983, visto por muitos como um mecanismo de fornecimento de mão de obra barata e de controle social, mas o YTS foi muito importante nesta conjuntura, diminuindo os custos para os clubes e permitindo revelar novos talentos como Paul Gascoigne, David Platt e Matthew Le Tissier.

(172) A maioria dos jogadores continuava a vir da classe operária com as áreas “tradicionais” de recrutamento [norte da Inglaterra, sobretudo áreas industriais e mineiras] continuando a serem fornecedoras importantes.

(172) Embora as restrições trabalhistas tenham mantido sob controle o número de jogadores estrangeiros no futebol inglês, um número pequeno porém influente de estrangeiros chegou no final dos anos 70, destacando-se os argentinos Osvaldo Ardiles e Ricardo Villa que foram contratados pelo Tottenham em julho de 1978.

(172) Em outubro de 1978 a pressão do sindicato dos jogadores convenceu o governo a só dar visto de trabalho aos jogadores que fossem considerados “’established’ performers” [de qualidade reconhecidamente alta]. Esta regra mais o fracasso de alguns dos jogadores importados em se estabelecer atrasou a vinda massiva de jogadores estrangeiros por mais 20 anos.

(172) Um dos traços mais impressionantes do período foi a gradual emergência dos jogadores negros no futebol inglês. Tinha havido uma presença marginal mas constante desses jogadores nos primórdios: o africano ocidental Arthur Wharton que jogou como goleiro pelo Preston em 1886-7 e depois pelo Rotherham Town; Walter Tull do Tottenham e Northampton que morreu em ação na I GM; Jack Leslie do Plymouth Argile, um jogador importante nos anos 20 e 30; e nos anos 50 Roy Brown, Lindy Delapenha e Charlie Williams.

(172) Sua cor era uma fonte de interesse para os jornalistas que invariavelmente revelavam por lapsos de linguagem um reflexo e um reforço dos estereótipos acerca dos hábitos, da cultura e do físico dos Afro-caribenhos. Em 1953, por exemplo, o Soccer Star chamou Delapenha, então jogando pelo Middlesbrough, de “insinuante (lithe) feito uma cobra... o rei da ponta da cor do café”, cujo jogo era abençoado com “o espírito do Calypso”. É interessante contrastar essa visão com um recente historiador do clube que se lembrava deste jogador mais prosaicamente como “forte e bastante trombador”.

(172-3) Neste contexto, o grupo de jogadores negros que ingressou no jogo nos anos 60 carregava uma pesada herança, pois qualquer falha percebida no seu jogo tendia a ser traduzida como uma critica dos jogadores negros em particula e do “temperamento negro” [as aspas são minhas, não do autor] em geral. A suposta inconsistência de Clyde Best, atacante do West Ham, originário das Bermudas e a crença de que Albert Johanneson, o ponta sul-africano do Leeds, não tinha espírito de luta são casos bastante ilustrativos.

(173) Por volta do início dos anos 70, começou a existir um bom número de jogadores negros profissionais nascidos na Inglaterra no pós-45, filhos de imigrantes. Sua emergência foi sublinhada pela convocação de Viv Anderson em 1978, o primeiro jogador negro a receber esta honra. Estes jogadores negros profissionais vinham quase que exclusivamente do Caribe.

(173-4) No caso dos asiáticos, praticamente só há o caso do anglo-asiático Ricky Heppolette, que jogou pelo Preston, Leyton Orient e Peterborough nas décadas de 1960 e 70.

(174) Uma complexa rede de fatores envolvendo tanto os valores das várias comunidades sul asiáticas quanto as percepções brancas destas comunidades travou o desenvolvimento de uma tradição asiática no futebol profissional inglês.

(174) A comunidade afro-caribenha, todavia, provou ser uma fonte fértil de jogadores a partir da década de 1970 e fornecia aproximadamente 15% dos jogadores profissionais da FL em 1995.

(174) Embora a comunidade afro-caribenha estivesse crescentemente bem representada no futebol inglês desde o final da década de 1970, é ainda possível perceber provas de atitudes estereotipadas acerca das suas habilidades e do seu engajamento [“raça” na terminologia dos jogadores brasileiros] retardando o seu progresso.

(174) Um estudo importante sobre os jogadores negros nos anos 90 mostrou que era bem mais provável encontrar jogadores negros na 1ª. do que nas divisões inferiores, sugerindo que os jogadores negros têm que ser bem melhores do que os restantes para serem aceitos.

(174) Ademais, o mesmo estudo mostrou que eles são mais frequentemente encontrados em posições associadas com a rapidez e a mobilidade [laterais, pontas, centroavantes, mas não meio-campistas, por exemplo] do que em posições associadas com o pensamento e a concentração.

(174) As tensões raciais na sociedade britânica apareciam de forma bem menos sutil nos terraces dos anos 70. Em uma conjuntura de ascensão da extrema-direita e de um clima econômico instável, os jogadores negros apareceram em número suficiente para serem percebidos por alguns torcedores mais como ameaça do que como uma novidade.

(174) O padrão clássico era o seguinte: os jogadores negros tornavam-se populares junto à torcida do seu clube, que convenientemente tornavam-se “cegos para a cor” (color blind), mas ficavam sujeitos a uma série de ofensas e abusos por parte dos torcedores adversários, tanto em casa como fora.

(174) Os jogadores davam um jeito de aguentar, com alguns da geração dos anos 70 afastando a tensão, embora relutantemente, ao aceitar alguma forma de “gozação” diante da sua presença. Três jogadores do West Bromwich Albion, por exemplo, bateram de frente com o manager que havia lhes chamado de “os três níveis (de cor)”.

(174) Embora a maioria dos managers escolhesse os jogadores de acordo com o mérito e o sindicato dos jogadores juntamente com um certo número de clubes e de clubes de torcedores tenham trabalhado para combater o problema, a existência de sérias ofensas raciais raramente era reconhecida pelas autoridades do jogo ou pela maior parte da imprensa. Brendon Batson, um dirigente do sindicato dos jogadores em 1984, sublinhou que os comentaristas da televisão geralmente ignoravam propositalmente as ofensas que eram bastante audíveis para os telespectadores sentados em casa.

(174-5) Uma campanha nacional anti-racismo foi lançada somente em 1993, quando os jogadores negros juntamente com um número crescente de estrangeiros europeus e sul-americanos já haviam se tornado uma parte substancial do conjunto de jogadores profissionais, e o futebol estava fazendo um sobre-esforço para construir uma imagem respeitável.

(175) Significativamente, mesmo então o principal financiador foi a Campanha pela Igualdade Racial e o Sindicato dos Jogadores [e não as autoridades do futebol].

(175) É claro que há comentários positivos a fazer. Afora seus geralmente consideráveis feitos futebolísticos, os jogadores negros serviram como modelos de vida para gerações mais jovens de negros e a sua presença em diversas seleções inglesas provavelmente contribuíu para o processo pouco mencionado pelo qual os brancos vieram a calmamente aceitar as realidades de uma sociedade multi-cultural.

(175) Independentemente de raça, cor ou credo, os jogadores profissionais experimentaram uma considerável melhora financeira neste período. Além dos benefícios provenientes da abolição do teto salarial em 1961, a posição de barganha dos jogadores e seus ganhos em potencial aumentaram quando algo muito próximo da liberdade contratual foi estabelecido em abril de 1978.

(175) Muito da informação disponível diz respeito somente aos salários básicos, sem atentar para jogos de despedida, bônus, taxas de transferência ou contratos publicitários de diversos tipos.

(175) Dentro destas limitações, podemos dizer o seguinte: os jogadores beneficiaram-se significativamente das mudanças no sistema contratual, mas as diferenças já existentes entre os principais jogadores e os restantes aumentaram muito. Este processo ocorreu imediatamente após a abolição do teto salarial como é demonstrado na tabela 7 (nesta página); entre 1960 e 64, 59% de aumento para os jogadores da 1ª. divisão contra somente 28% para os jogadores da 4ª. divisão.

(175-6) Estes diferenciais se mantiveram ao longo do período. Em termos da relação entre os salários dos jogadores e dos da comunidade em geral, os diferenciais aumentaram muito em favor dos jogadores, pelo menos para aqueles nas duas primeiras divisões. O nível médio de remuneração, todavia, não era tão espetacular quanto às vezes se pensa. Em 1985, 70% dos jogadores ganhavam abaixo de 15.000 libras por ano, um salário pago à época aos diretores de escolas, acadêmicos senior e médicos bem estabelecidos; 90% dos jogadores ganhavam abaixo de 20.000 libras por ano. Somente alguns dos mais bem pagos jogadores da 1ª. divisão estavam ascendendo para um estilo de vida bastante confortável de classe média e não de super-ricos.

(176) As recompensas para os jogadores principais podiam ser tremendas. De qualquer forma, ainda em 1965-6, a maioria das estrelas do Manchester United ganhava apenas 50 libras por semana. Os maiores aumentos de salário vieram nos anos 70 e 80. E isto era apenas parte do quadro, com muito mais oportunidades para trabalhar em comerciais e na imprensa, com os altos salários permitindo aos jogadores abrindo negócios. No final dos anos 60 alguns jogadores ganhavam mais em dois ou três anos do que um profissional ganhava em toda a sua carreira antes de 1961. Uns abriam negócios, uns eram bem sucedidos, outros fracassavam e houve até quem necessitasse de jogos de caridade ou que morresse na miséria como o sul-africano Albert Johanneson em 1995 em um apartamento em Leeds com problemas de alcoolismo.

(176) A melhora nas condições materiais foi acompanhada pela melhora do status em termos públicos. Stanley Matthews foi sagrado cavaleiro em 1965, Alf Ramsay em 1966 e Matt Busby em 1969, os três primeiros cavaleiros fora das instâncias administrativas do futebol.

(176-7) Houve um reconhecimento cada vez maior nas revistas, televisão e rádio que suplementavam as já tradicionais reportagens e entrevistas após o jogo. Os jogadores frequentemente eram filmados ou fotografados na companhia de estrelas do show business, tornando os jogadores “personalidades” enquanto a linha que separava o esporte e o show business era cada vez menos nítida, a partir de shows na TV e de gravações de músicas populares por parte de times e da seleção.

(178) Um pequeno mas significativo exemplo do status crescente dos jogadores é proporcionado pela forma com que eram mencionados nos programas dos jogos. Até os anos 60 os programas tratavam os jogadores como espécimens atléticos na linguagem de uma feira de gado: origem geográfica, altura, peso, posição e uma ou outra informação sobre habilidades especiais. A partir do fim dos 60 e nos anos 70 os jogadores são entrevistados acerca do seu gosto musical, gastronômico, filmes e por aí vai.

(178) É claro que houve momentos em que a melhora da imagem dos jogadores foi prejudicada. Foi o que aconteceu em 1965 quando se descobriu uma rede de corrupção (combinando resultado de jogos) que envolvia 10 jogadores, incluindo 3 da seleção, que foram banidos do jogo para sempre. O pior é que o esquema parece ter estado a funcionar há vários anos e provavelmente envolvia muito mais pessoas que não foram levadas ao tribunal. Mas o escândalo era algo que já fazia parte da história do futebol e da vida pública em geral e o dano não foi maior.

(178) Todas essas mudanças reestruturaram as relações entre os jogadores e o seu público de alguma maneira. Houve um afastamento crescente entre jogadores e torcedores à medida em que os jogadores mudavam-se para áreas “nobres” e boa parte dos seus encontros passou a ser mediada pela imprensa.

(178) Stephen Wagg, um pioneiro no estudo sociológico do jogador moderno, vê as mudanças de relacionamento como profundas, argumentando que através das suas aparições e declarações públicas e das sua autobiografias, os jogadores principais tornaram-se “guardiões exemplares do novo capitalismo consumista, catapultados, muitos deles, das suas origens de classe operária para as maravilhas amplas, azuis e novo-burguesas e mandando de volta pequenos fragmentos de dogma simples e comercial para alimentar o seu público.” Certamente, muitos jogadores foram projetados como poderosos modeleos de um estilo de vida aquisitivo e consumista.

(179) Essa tem sido a função chave do entertainer (artista do entretenimento) desde o século XIX pelo menos. Wagg certamente está correto em ver o jogador de futebol como alguém que, tirando notáveis e poucas exceções, raramente questiona publicamente o status quo social, econômico ou político. A verdadeira influência desempenhada pelos jogadores nesta área é difícil de medir. Afinal os torcedores ficavam sabendo não somente dos jogadores que enriqueciam mas também do jogador que gastava tudo e terminava sua carreira em um quarto-e-sala, ou tinha sua carreira abreviada por uma contusão ou por uma transferência equivocada.

(179) As grandes mudanças do período trouxeram tanto problemas quanto recompensas. As pressões tradicionais agora eram frequentemente aumentadas pela atenção da mídia e por questões financeiras, levando os jogadores principais a terem altos níveis de stress. E.g. o fenômeno George Best, um prodígio aos 17 anos e cuja carreira de alto nível terminou efetivamente aos 28 anos.

(179-180) O papel do sindicato dos jogadores inevitavelmente mudou à medida em que melhoraram os salários e as condições graças em boa parte à luta do sindicato. Em 1973 os tempos de militância já haviam passado. Mas o sindicato desempenhou um papel importante ajudando clubes endividados, pagando os salários dos jogadores em pelo menos 15 ocasiões e emprestando dinheiro aos clubes para auxiliá-los em meio a desastres financeiros. Houve também o envolvimento em um trabalho menos espetacular mas também vital, incluindo tentativas de aumentar as oportunidades educacionais dos jogadores e desempenhando um papel importante na administração do esquema do YTS (Youth Training System). Em suma: o sindicato dos jogadores conseguiu adaptar-se a um período com necessidades e características muito diferentes.

(180) No que diz respeito ao futebol feminino, ele estava mais firmemente estabelecido com a criação da Women’s Football Association em 1969; em 1979 já havia 278 clubes afiliados. Mas ainda faltava muito para o futebol feminino granjear alguma credibilidade junto aos homens e popularidade junto às mulheres. Até o fim dos anos 80 era ainda utilizado para fazer piada. Exemplo: o Football Digest de 1973 que satirizava os problemas criados pelas especificidades (altamente caricaturadas) da biologia feminina. O futebol, dentro e fora de campo, continuava a ser uma república masculina por excelência.